Resumo |
O racismo, como uma das heranças mais duradouras e violentas da experiência da escravidão, é uma das forças definidoras de toda sorte de processos de exclusão dirigidos à população afro-brasileira, incluindo-se as formulações da memória coletiva e identificação do Patrimônio Cultural nacional (e local), da qual a presença negra ainda é hegemonicamente alijada. Diante de tal quadro, o presente trabalho intenta colaborar para o avanço das discussões sobre o racismo estrutural e sua influência na percepção do patrimônio cultural afro-brasileiro, especificamente no município mineiro de Viçosa, a partir da construção de um inventário participativo, constituído a partir de diálogo direto com a população local, através do qual espera-se construir novos entendimentos em torno da cultura afro-brasileira local, bem como dialogar com as apropriações e ressignificações a ela relativos, constituindo-se como instrumento de educação para as relações étnico-raciais e de combate ao racismo. Para tanto, elegeu-se como metodologia a aplicação de uma pesquisa de survey a partir da disponibilização de um formulário online, divulgado, principalmente por meio digital, no qual a população pôde indicar os bens culturais afro-brasileiros presentes em Viçosa, bem como sua interpretação acerca de sua existência e (in)visibilidade, além de possíveis ressonâncias do racismo estrutural em sua percepção. A partir das colaborações até aqui obtidas, o trabalho indica que há baixo reconhecimento da existência de bens culturais afro-brasileiros no município, bem como ações de promoção e proteção, sendo que a maioria dos respondentes indica que o patrimônio cultural relacionado à presença negra não é valorizado pela sociedade brasileira e que o racismo tem ainda influência direta neste processo. De outro lado, as respostas indicam ainda, entre os bens culturais reconhecidos, a predominância daqueles de natureza imaterial, contra apenas uma indicação de bens materiais. Tal resultado aponta para questões como o peso da “imaterialidade” do patrimônio afro-brasileiro, especialmente as celebrações, como marca local, em contraste com a ideia de “monumentalidade material”, que está diretamente relacionada às “tradições” ocidentais ou eurocêntricas ainda muito presentes neste campo. |