Resumo |
A presente pesquisa tem por objetivo entender a construção histórica sócio-político-cultural e narrativa que fundamentou a tentativa de beatificação da Princesa Isabel do Brasil, também conhecida como “A Redentora”, em um período de mudanças de narrativas historiográficas e expansão de estudos sobre a temática de escravidão no Brasil-colônia, ocorridas entre a última década de XX, e as primeiras duas décadas de XXI. O processo de canonização foi formalizado em 2011 pela Arquidiocese do Rio de Janeiro, e contou com a ajuda, fundamental e emblemática, de Hermes Rodrigues Nery, Arcebispo Dom Orani João Tempesta, e do autodenominado “príncipe” Dom Antônio João de Orléans e Bragança. Observamos que a tentativa de santificação tratou-se de uma mobilização de cunho político-religioso-reacionário, e envolveu setores mais conservadores da Igreja Católica, anti-progressistas, movimentos pró-monarquistas e organizações “pró-vida”. As várias narrativas por trás desse processo giram em torno da santidade da princesa, heroicizada pelo ato abolicionista e por sua fé católica. Sua figura é celebrada como santa “redentora” do povo preto, e sua “bem-aventurança” estendida à defesa da vida contra o aborto. Não obstante, a narrativa de pleito à beatificação usa como importante argumento as festas de 13 de Maio, que acontecem anualmente no Bairro do Quilombo do município de São Bento do Sapucaí/SP. Pretende-se, com isso, defender a aceitação social e cultural em torno da figura— aqui santificada— “Santa Princesa Isabel”. Em contrapartida, temos um cenário historiográfico que busca erguer novas memórias à história brasileira, com representantes populares que por muito tempo foram invisibilizados pela chamada “História Oficial” brasileira, por exemplo Zumbi dos Palmares. Essas novas narrativas tiram de Isabel a heroicidade e o protagonismo no ato abolicionista, e fortalecem a memória de luta desses outros personagens pela libertação escravagista. Surge, assim, um cenário brasileiro marcado pela disputa narrativa de uma história oficial contra uma história dos invisibilizados, onde o processo de beatificação de Isabel pode ser entendido como uma luta reacionária pelo fortalecimento da memória oficial e monarquista contra novas memórias nacionais, movimentos democráticos e progressistas. Nossa pesquisa empírica é fundamentada no recurso a documentação pública sobre a vida da Princesa Isabel, matérias de imprensa, bibliografias e dados coletados na internet. |