Resumo |
O Código Florestal de 2012 (Lei 12.651/2012) instituiu vários retrocessos em relação ao Código Florestal de 1965 (Lei 4.771/1965) no que tange à proteção das Áreas de Preservação Permanente (APPs). Essas são espaços de vegetação nativa com a finalidade de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e garantir o bem-estar humano. Um dos principais retrocessos ocorreu nas APPs ripárias com a alteração do seu marco inicial. Na vigência da Lei Florestal anterior, o marco inicial das APPs de rio era definido a partir do nível mais alto alcançado durante suas cheias sazonais. O novo Código Florestal determina sua fixação a partir do leito regular. Tendo em vista que as planícies de inundação ficaram desprotegidas e que são espaços de alta relevância ecológica e econômica, é imprescindível compreender as consequências de tal mudança legislativa. O objetivo desta pesquisa é analisar as consequências da alteração do marco inicial das APPs ripárias para a segurança e o bem-estar humano, bem como as implicações ambientais, especialmente em certos biomas brasileiros. A metodologia adotada consistiu em revisão bibliográfica de artigos científicos, livros, legislação e relatórios climáticos. A Lei 7.803/1989 alterou o Código Florestal de 1965 para fixar o leito do rio a partir do nível maior alcançado pela água. Essa retificação foi feita em virtude das catastróficas enchentes que assolaram o Brasil em 1983 e 1984. A adoção da calha por onde corre regularmente a água como marco inicial das APPs aumenta a probabilidade de novos desastres socioambientais, os quais podem resultar em mortes e perdas econômicas. Ao retirar a proteção das planícies de inundação, populações vulneráveis podem estabelecer residências nesses espaços. Com a intensificação das chuvas decorrente das mudanças climáticas, essas pessoas serão as principais atingidas. O Brasil já ocupou significativa parte de suas várzeas. Embora as planícies de inundação sejam muito visadas para a agricultura, o Legislador deveria ter protegido as várzeas ainda intactas em face de suas relevantes funções, a exemplo de reservatório de biodiversidade, corredores ecológicos, barreira para assoreamento pela erosão e desbarrancamentos, além de dissipar a força da água e minimizar enchentes. O uso agrícola dessas áreas reduz a infiltração da água de chuva e a recarga do lençol freático, em virtude da compactação do solo. Em biomas como Pantanal e Amazônia, cujas planícies de inundação são muito extensas, as perdas de áreas protegidas são significativas. Estima-se que 60% das várzeas inundáveis podem perder sua proteção no bioma Amazônico, pondo em risco as Matas de Igapós que podem ser desmatadas agora. Logo, o Poder Legislativo deveria, com base no princípio da prevenção, ter restringido o uso das várzeas alagáveis àquelas já ocupadas, adotando medidas para realocar, futuramente, a população que habita os espaços de risco. |