| Resumo |
O incêndio que destruiu parte significativa do Museu Nacional, em setembro de 2018, foi mais do que uma tragédia patrimonial. O evento representou um colapso institucional, levantando questões sobre identidade, legitimidade e continuidade da organização. Este artigo investiga como a resiliência organizacional tem sido discursivamente construída por meio de práticas de trabalho institucional, a partir da análise de 1.704 postagens no Facebook do Museu Nacional, entre 2018 e 2023. Adota-se uma abordagem processual, fenomenológica e analítica baseada na articulação entre abdução e indução. A análise organiza-se em torno das categorias de criação, manutenção e ruptura institucional discutidas por Lawrence & Suddaby (2006), e revela que a reconstrução do Museu Nacional tem se dado por meio de um trabalho simbólico intenso, que combina a reiteração de sua missão científica, a mobilização de redes de apoio institucionais e a reconfiguração de uma nova identidade organizacional. Observa-se que a dimensão da “criação” domina o discurso institucional, refletindo a tentativa de reposicionar o Museu como agente legítimo e ativo no campo científico e cultural brasileiro. Essa criação não é apenas material, mas profundamente simbólica: envolve a ativação de narrativas de renascimento, a reafirmação do valor da ciência e a produção contínua de conhecimento, mesmo diante da adversidade, por meio de postagens que destacam projetos de pesquisa, atividades de ensino, exposições e colaborações. A dimensão "manutenção" aparece com destaque na reafirmação de valores institucionais históricos, como a ciência, a memória e a educação pública, além da retomada de eventos, rituais e práticas que reforçam a continuidade simbólica da organização. Já a dimensão "ruptura" ocorre de forma mais discreta, sugerindo uma escolha estratégica da organização por evitar o confronto direto com atores que os culpavam de negligência e má gestão do patrimônio histórico-cultural, e enfatizar a resiliência colaborativa na construção de respostas eficientes à situação de crise. Conclui-se que a resiliência do Museu Nacional não está apenas na sua capacidade de reconstrução física, mas na sua habilidade de produzir sentido, articular legitimidade e sustentar uma identidade em transformação. O caso revela como organizações podem mobilizar estratégias discursivas e práticas de trabalho institucional para reconstituir sua existência em meio ao colapso, contribuindo para o avanço das teorias sobre temporalidade, identidade e agência institucional em contextos de crise. |