Resumo |
Geophagus brasiliensis, cará, é uma espécie de peixe nativa do Brasil presente na Bacia do Rio Doce, sendo utilizada como bioindicador ambiental para monitoramento do ecossistema aquático. Trata-se de uma espécie iliófaga que se alimenta de detritos, vegetais, insetos, moluscos e algas no fundo dos rios, estando em contato direto com o sedimento. O Rio Doce é de grande importância na região Sudeste do Brasil, abastecendo municípios dos estados de Minas Gerais e Espírito Santo. Engloba o município de Mariana-MG, região de forte atividade mineradora. No final de 2015 houve o rompimento da barragem de Fundão, em Mariana-MG, despejando toneladas de rejeitos que atingiram todo o Rio Doce. O objetivo do estudo foi avaliar o intestino do cará em duas áreas da Bacia do Rio Doce, uma área afetada no Rio Doce, em Santa Cruz do Escalvado-MG, e uma área não afetada no Rio Piranga, em Ponte Nova-MG, três anos após o rompimento da barragem. Coletou-se oito animais em cada rio e após eutanásia foram medidos, pesados e os intestinos fixados em formol tamponado, sendo transferidos para álcool 70%. Os intestinos foram medidos, obtendo-se o coeficiente intestinal (comprimento intestinal/ comprimento corporal). Amostras do intestino cranial foram desidratadas em série alcóolica e incluídas em resina. Realizou-se cortes semi-seriados de 3 μm de espessura em micrótomo rotativo. As lâminas foram coradas com azul de toluidina (AT) e analisadas em fotomicroscópio com a objetiva de 10x, obtendo-se 10 imagens para cada animal, que foram analisadas no software Image Pro Plus. Mediu-se altura e largura das pregas intestinais, altura das camadas musculares e da submucosa, e altura do epitélio. Tais medidas foram divididas pela altura total da parede intestinal, para obtenção de índices relativos ao tamanho dos peixes. As análises estatísticas foram feitas no software SigmaStat usando o teste Mann-Whitney para comparar os peixes das duas áreas. As diferenças foram consideradas significativas em P≤0,05. Os seguintes resultados foram obtidos para os peixes afetados, com diferença significativa: largura relativa das pregas intestinais menor (P<0,001); altura relativa da camada muscular maior (P=0,046), com a muscular interna mais espessa (P=0,003); altura do epitélio menor (P≤0,001), apresentando uma desorganização celular, não sendo possível observar os núcleos orientados na base, além de possuir mais células caliciformes que, diferentemente daquelas dos peixes não afetados, foram coradas pelo AT. A altura relativa das pregas intestinais (P=0,057) e da camada submucosa (P=0,693), assim como o coeficiente intestinal (P=0,505), não apresentaram diferença significativa. A partir dessas análises é possível concluir que houve mudanças histológicas no trato intestinal dos peixes do Rio Doce comparados aos do Rio Piranga, muito provavelmente em razão dos rejeitos liberados pelo rompimento da barragem, o que pode refletir na fisiologia digestiva e nutrição dos animais. |