Resumo |
A ovalbumina (OVA) é a proteína mais abundante da clara do ovo. Além do alto valor nutricional, apresenta relevantes propriedades técnico-funcionais, sendo um agente espumante e gelificante de grande aplicabilidade na indústria alimentícia. Em diferentes pHs e temperaturas, sua estrutura nativa sofre alterações conformacionais que impactam diretamente suas técnico-funcionalidades. Uma investigação in vitro rigorosa dessas alterações requer diferentes equipamentos de altíssimo custo e proteínas com pureza ~ 100%, onerando muito o estudo. Alternativamente, métodos moleculares in silico (computacionais) permitem um estudo conformacional detalhado e acurado de proteínas tecnologicamente relevantes, desde que sua estrutura cristalográfica 3D tenha sido elucidada, como é o caso da OVA. Assim, o objetivo deste trabalho foi aplicar dinâmica molecular (DM) computacional para evidenciar e compreender, em nível molecular, as mudanças conformacionais da OVA em nove condições consistindo na combinação (esquema fatorial) das temperaturas 30, 55 e 85 °C e pHs 3, 4,5 e 6 (condições reais a que a proteína é exposta em diferentes processamentos industriais). Os resultados de RSMF para os nove casos evidenciaram as regiões da proteína com flutuações médias superiores a 0,3 nm. A visualização das trajetórias de DM mostrou que tais regiões corresponderam a regiões esperadamente flexíveis (loops), que apresentam interações intramoleculares menos estáveis. Ademais, a análise de RMSD das proteínas ao longo das trajetórias de DM mostrou maior estabilidade estrutural da OVA em pH 6,0 a 30 °C, ao passo que mudanças conformacionais mais drásticas ocorreram em pH 3,0 a 85 °C. Os De fato, o primeiro caso corresponde a condições de temperatura branda e pH próximo ao da clara do ovo, enquanto o segundo corresponde a uma temperatura elevada e pH consideravelmente ácido. A 55 °C, o sistema a pH 4,5 apresentou as menores variações conformacionais, comparado aos pHs 3 e 6. Esse valor de pH é próximo do ponto isoelétrico da proteína, indicando que no caso da OVA a carga elétrica líquida praticamente nula contribui para a estabilidade da estrutura nativa. Para algumas aplicações tecnológicas, entretanto, é desejável que a proteína apresente desnaturação parcial, de forma que os resíduos hidrofóbicos localizados em seu interior sejam expostos ao solvente, se tornando disponíveis para novas interações intermoleculares ou para contatos da proteína com interfaces. Assim, nossos resultados indicaram que, dentre as condições de tempratura/pH estudadas, os binômios 55 °C/pH 6, 85 °C/pH 6 e 85 °C/pH 4,5 são os mais promissores para potencializar propriedades espumantes ou gelificantes da OVA. A verificação in vitro desses resultados será feita a posteriori, e constituirão a continuidade desta pesquisa. O presente estudo exemplifica o quão útil a dinâmica molecular computacional é como metodologia para compreender as bases moleculares da técnico-funcionalidade de proteínas alimentares. |