Resumo |
As mudanças climáticas, a segurança energética, o esgotamento das fontes energéticas não renováveis e a produção de energia a partir de insumos renováveis são temas controversos, ainda mais quando articulados. Dentre os artefatos que são alvos de controvérsias, atualmente, estão as fontes alternativas de energia. Este trabalho objetiva cartografar as controvérsias sociotécnicas a respeito do papel ambiental e social do biodiesel, em fontes acadêmicas e não acadêmicas de divulgação do conhecimento científico e tecnológico. Objetiva-se mapear as controvérsias inerentes ao processo de concepção e adoção do artefato biodiesel nos âmbitos: 1) das especificações do biodiesel; 2) das matérias-primas, gerações do biodiesel e suas interações com os motores; 3) dos relatórios do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC), Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas (PBMC) e os históricos de emissões do biodiesel; 4) do Plano Nacional de Produção e Uso do Biodiesel (PNPB) e de seus desdobramentos; 5) do Selo Combustível Social e da agricultura familiar no Brasil. A cartografia de controvérsias é uma metodologia composta por um conjunto de técnicas que permite explorar e visualizar questões do debate sociotécnico contemporâneo, como a pesquisa documental, via web e entrevistas. A coleta e análise de dados foram feitas a partir de artigos científicos frutos de pesquisas no Brasil e no exterior, assim como artigos opinativos disponíveis em sites e blogs, e do acompanhamento diário via web dos principais atores da rede de interessados no biodiesel. Foram realizadas entrevistas qualitativas com dois pesquisadores que têm relação direta com as controvérsias que envolvem o biodiesel, um deles do Instituto de Pesquisa da Amazônia e o outro da Universidade Federal de Viçosa. Alguns resultados são: 1) um grupo força tarefa entre Brasil, União Europeia e Estados Unidos discutiu o possível alinhamento entre as especificações do biodiesel nas suas regiões, porém esta harmonização ainda não foi possível; 2) o biodiesel de primeira e segunda geração tem sofrido ceticismo por parte da comunidade científica, pois o uso do solo gera efeitos diretos e indiretos nas emissões de gases do efeito estufa; 3) o biodiesel afeta a potência e economia dos motores; 4) a combustão do biodiesel diminui as emissões dos gases do efeito estufa, mas aumenta as emissões de NOx, considerado mais danoso ao aquecimento global que os demais gases; 5) a soja, biodiesel de primeira geração, se consolidou como principal matéria-prima para produção de biodiesel no Brasil e o Selo Combustível Social ainda não atingiu todas as expectativas previstas pelo governo. Logo, a rede do biodiesel se configura simultaneamente como uma rede de concepção e adoção e, com o objetivo de se consolidar como uma “caixa-preta”, essa rede mobilizou e ainda mobiliza redes de negociações entre diversos atores heterogêneos, demandando a renegociação de laços de redes antigas e o surgimento de novas redes. |