| Resumo |
O direito à cidade, a segregação socioespacial e a produção do espaço urbano são temáticas recorrentes no campo da Arquitetura e Urbanismo. No entanto, as desigualdades raciais e de gênero no acesso à cidade foram, por longo período, negligenciadas nas reflexões urbanísticas no Brasil, refletindo-se nas disparidades estruturais que permeiam a conformação das dinâmicas do espaço urbano. Em contrapartida, nas Ciências Sociais, estudos interseccionais sustentam ser essencial considerar conjuntamente questões de gênero, raça e classe para a compreensão das dinâmicas que moldam a produção do espaço. Nesse contexto, nota-se uma lacuna teórica e acadêmica expressa na escassez de estudos que articulam Arquitetura e Urbanismo e interseccionalidade. Logo, o objetivo dessa pesquisa é integrar as duas áreas do conhecimento de forma a compreender o desenvolvimento territorial a partir da lente da interseccionalidade, tendo como recorte o bairro Nova Viçosa, Viçosa (MG). A pesquisa foi conduzida em três etapas. Na primeira, realizou-se uma revisão bibliográfica com o intuito de identificar autores(as) que discorrem sobre a fundação do bairro Nova Viçosa; a compreensão da expansão urbana do município, identificando as segregações urbanas e raciais; e a interseccionalidade em metodologias para análise da produção do espaço urbano. Em seguida, foram analisadas entrevistas já publicadas com os(as) primeiros(as) moradores(as) do bairro, mediante levantamento documental, visando, por meio da lente interseccional, pontuar questões de gênero, raça e classe presentes nestes depoimentos. Por fim, para compreender as condições atuais do bairro, foram feitas visitas em campo, coletados dados demográficos e socioeconômicos com recorte racial, de gênero e de classe a partir do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), além de arquivos do site da Prefeitura de Viçosa. A análise documental evidenciou que o bairro Nova Viçosa, desde sua fundação, expõe uma série de questões que vão da segregação espacial de classes à questões relativas a desigualdades raciais e de gênero. Essas questões foram reveladas através do site da Prefeitura, que apresenta 518 documentos sobre o bairro e registra, desde 1989, a necessidade de infraestrutura urbana no local, que somados aos dados do IBGE e às observações de campo, apontam as desigualdades expressivas, tanto pela ausência de infraestrutura, quanto pelas condições socioeconômicas. Contudo, a persistência dessas negligências, afetam de modo mais contundente a vida cotidiana das mulheres negras da comunidade. São elas que enfrentam os maiores desafios ligados à precariedade dos serviços públicos, à mobilidade urbana dificultada e à sobrecarga do trabalho doméstico e de cuidado, agravando a sua vulnerabilidade social. Diante disso, ressalta-se a urgência da elaboração de políticas públicas que interpretem os dados interseccionais e incluam práticas mais efetivas que respondam às reais condições dos(as) moradores(as) do bairro. |