| Resumo |
As tartarugas (Testudines) são caracterizadas por apresentarem escudos epidérmicos recobrindo o casco, com raras exceções, como Dermochelys coriacea, que não apresentam escudos. Todas as espécies de tartarugas marinhas da família Cheloniidae podem ser identificadas especificamente com base na contagem e morfologia dos escudos epidérmicos da cabeça e, sobretudo, do casco. Contudo, variações ou anomalias na quantidade e simetria dos escudos pode dificultar a identificação dos indivíduos. A folidose (isto é, o arranjo dos escudos) do casco de Testudines segue um modelo no qual a posição dos escudos é determinada por uma segmentação somítica primária do embrião. Anomalias ou variações podem ser associadas à segmentação do corpo durante o desenvolvimento embrionário, como o posicionamento dos mioseptos transversos do tronco, marcados por invaginações septais durante os estágios iniciais da embriogênese, e posteriormente pelas costelas. Escudos pleurais e vertebrais surgem em invaginações septais ímpares e pares, respectivamente, o que pode gerar zonas livres para o surgimento de escudos supranumerários. Neste trabalho, procuramos verificar se pode haver congruência entre o posicionamento de mioseptos e de escudos córneos normais e supranumerários, utilizando indivíduos natimortos coletados em trabalhos anteriores nas praias de Guriri e Linhares, Espírito Santo. Para isso, exemplares de Lepidochelys olivacea (n=14) e Caretta caretta (n=11) foram fotografados em vista dorsal e contornos dos escudos da carapaça dos espécimes foram traçados manualmente com o uso de uma mesa digitalizadora. O traçado foi feito com base nos limites visuais dos escudos, preservando as proporções e a escala original. As imagens foram utilizadas para inferir o posicionamento de mioseptos com base na disposição dos escudos marginais permitindo a estimativa das posições esperadas para os escudos pleurais e vertebrais, distinguindo escudos supranumerários e normais. Os exemplares analisados se encaixam no padrão de posicionamento de escudos sugerido, em concordância com o padrão de folidose esperado, no qual inferimos que os escudos supranumerários estão dispostos em invaginações septais vagas durante a embriogênese, o que pode explicar a variação interespecífica e intraespecífica dos escudos. Acrescentamos que escudos que apresentavam variações na forma podem ser associados a fusões parciais ou incompletas e que, provavelmente, assimetrias bilaterais em número de escudos são anomalias e padrões simétricos, mesmo que supranumerários, são variações individuais ou interespecíficas. Este estudo é relevante para enriquecer o conhecimento acerca de variações em caracteres diagnósticos de espécies e as suas possíveis causas de ocorrência, além de potenciais impactos para os indivíduos e populações. |