| Resumo |
O presente estudo tem como objetivo descrever a trajetória da assistência em saúde mental no Brasil, examinando o período pré-Reforma Psiquiátrica, marcado pela exclusão e estigmatização, e as transformações ocorridas no pós-Lei 10.216/2001, de modo a fundamentar o fenômeno da medicalização do sofrimento psíquico na contemporaneidade. A pesquisa é de nível exploratório, adota uma abordagem qualitativa, utilizando como material a revisão bibliográfica de livros, artigos científicos e documentos oficiais, com foco na base de dados SciELO. Os descritores utilizados na busca incluem "medicalização" e "desfinanciamento da saúde mental". A análise do material é realizada por meio da técnica de análise de conteúdo, dividida em pré-análise, exploração e interpretação dos dados, com o Materialismo Histórico Dialético como referencial analítico. Os resultados parciais indicam que, historicamente, a assistência em saúde mental no Brasil foi dominada por um modelo asilar, que, por mais de um século, confinou e patologizou indivíduos, apoiando-se em premissas organicistas e eugenistas. A medicalização, entendida como a predominância da lógica farmacoterapêutica, intensificou-se nesse período, com práticas desumanizadoras, tratamentos abusivos e uso indiscriminado de métodos coercitivos, como eletrochoques e sedativos, mesmo sem justificativa psiquiátrica. A Liga Brasileira de Higiene Mental, no início do século XX, exemplifica essa ideologia, promovendo a "higienização mental" e a exclusão dos "degenerados", com a medicalização justificando o controle social (Seixas et al., 2009). Com a Reforma Psiquiátrica, a partir da década de 1980, e a promulgação da Lei nº 10.216/2001, houve uma reconfiguração dos modelos de tratamento, com a desinstitucionalização e a criação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e dos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS). Apesar desses avanços, a medicalização do sofrimento psíquico persiste como um desafio, muitas vezes impulsionada por medidas de austeridade fiscal, com a prescrição exclusiva de psicofármacos, negligenciando as dimensões subjetivas, sociais e culturais do sofrimento. As conclusões preliminares deste estudo apontam para a necessidade de constante reflexão crítica sobre as práticas contemporâneas em saúde mental, a fim de superar os resquícios do modelo asilar e fortalecer abordagens mais integrais e humanizadas que promovam a autonomia e a inclusão social dos usuários, rompendo com a lógica reducionista e de hegemonia da medicalização. |