Resumo |
Neste trabalho, analisaremos como o rap deixou de ser visto, principalmente pelas elites, de uma forma preconceituosa e conseguiu circular nos espaços midiáticos tradicionais. Sendo assim, apresentaremos possíveis motivações que levaram esse gênero musical a superar barreiras e estigmas impostos pela sociedade e pela mídia brasileiras. Para tanto, serão realizadas análises comparativas entre os versos contemporâneos de Emicida e os dos Racionais MCs, produzidos na década de 90, pois compreende-se que, por meio da conexão entre esses dois artistas, é possível inferir como o rap saiu do Capão Redondo e chegou ao Teatro Municipal de São Paulo, espaço historicamente ocupado apenas pelas elites. Desse modo, para a realização desta pesquisa, foram considerados tanto aspectos estéticos (à luz da teoria literária e da semiótica da canção), quanto histórico-sociais (à luz dos estudos historiográficos e sociológicos da canção brasileira), incluindo, nesse caso, também entrevistas e marcas biográficas dos artistas. Foi essencial, pois, trazer à pesquisa o álbum “Sobrevivendo no Inferno”, marco fundador do rap brasileiro, cotejado com canções contemporâneas de Emicida, como “Passarinhos”, principal responsável pela inserção do rapper no cenário da grande mídia e da consagrada Música Popular Brasileira. Nesse contexto, é possível concluir que há uma semelhança conceitual e estética entre o rap dos Racionais e o gênero literário épico, enquanto, por sua vez, há semelhança entre as canções de Emicida e o gênero lírico. Isso ocorre, por um lado, pela composição narrativa, prosódica e heróica do discurso cancional de Mano Brown e, por outro, pela composição mais emotiva, melódica e subjetiva de Emicida. Dessa maneira, é notório como essa analogia evidencia que, mesmo os rappers retratando cenários e espaços periféricos semelhantes, há uma nítida diferença no estilo de suas produções e no produto estético entregue ao público. Chegamos, pois, à conclusão de que essa distinção, refletida na constituição dos versos, no uso do vocabulário, das metáforas e da sonoridade das canções, possibilitou ao grupo da primeira geração conquistar espaço mais restrito no mercado da grande mídia, enquanto Emicida, em virtude das composições mais líricas (portanto, menos prosódicas), alcançou espaços restritos, historicamente, apenas às elites, como o Teatro Municipal, onde gravou o recente e aclamado espetáculo “Amarelo”. |