Resumo |
O rompimento da “barragem de Fundão” provocou diversos danos ambientais e socioeconômicos, bem como a morte de 19 pessoas. Em face à multiplicidade de vítimas e a dificuldade de quantificação dos supracitados danos, foi firmado um Termo de Transação e Ajustamento de Conduta (TTAC), por meio do qual a Samarco Mineração S.A. se comprometeu a implementar programas de reparação. O Programa de Indenização Mediada (PIM) foi elaborado a partir do levantamento dos danos socioeconômicos indenizáveis e do desenvolvimento de uma matriz de danos. Todavia, em virtude da rigidez na exigência de provas e da informalidade das atividades desenvolvidas por determinadas categorias profissionais na região do desastre, diversas pessoas ficaram desprotegidas. Para solucionar este problema, ações coletivas foram ajuizadas pedindo a flexibilização dos meios de comprovação dos danos e a fixação de uma matriz de dano específica para as categorias profissionais informais. Em razão disso, foi concebido e implementado o Sistema Indenizatório Simplificado, conforme os parâmetros fixados nas sentenças. Apesar dos incentivos à adoção de meios extrajudiciais de solução de conflitos, há que se questionar os pontos positivos e negativos dos dois supracitados programas de reparação de danos, tendo em vista o desequilíbrio de poder econômico entre os atingidos e a pessoa jurídica empresária responsável pelo desastre, e do estabelecimento a priori de uma matriz de danos. Sendo assim, o objetivo deste trabalho foi analisar os supramencionados programas de reparação à luz dos princípios da restitutio in integrum e do acesso à Justiça. A metodologia utilizada consistiu em revisão bibliográfica de artigos científicos, livros e sentenças judiciais, bem como a análise de dados disponibilizados pela Fundação Renova. Tendo em vista que o acesso à Justiça não se resume apenas em disponibilizar meio adequado de solução de conflito, mas também possibilitar a obtenção de resultado justo, o Sistema Indenizatório Simplificado permitiu que pessoas que não conseguiriam pleitear indenização pelos danos, por meio de ação individual ou através do PIM, pudessem alcançar a reparação destes. Todavia, a fixação da matriz de danos, através do que se denominou rough justice, ocorreu sem rigor metodológico e uso de amostragem que esse instituto adota. Ademais, o modo como o processo de reparação ocorreu evidencia a perda do aspecto punitivo e educativo da reparação, uma vez que o processo, inclusive a determinação dos danos indenizáveis e o valor econômico atribuído como indenização, foi gerido pela Fundação Renova, pessoa jurídica criada pela Samarco Mineração S.A., ainda que sob acompanhamento de órgãos estatais. Portanto, a facilitação do acesso à indenização, que representou uma conquista no que tange ao acesso à Justiça, restringiu o debate em torno de direitos e resultou na imposição de condições favoráveis para a mitigação da responsabilidade, em termos econômicos, da Samarco Mineração S.A. |