Resumo |
A Lei Maria da Penha tem o objetivo de proteger mulheres dos seus agressores, além de estabelecer as bases para os serviços relacionados à violência contra mulher. Contudo, não prevê a diferenciação dos serviços a partir dos diversos contextos das mulheres em situação de violência. Também na maioria dos relatórios sobre o tema não se delimita, por exemplo, a zona de habitação dessas mulheres. Nesse sentido, torna-se mais difícil entender de que forma acontece a violência contra as mulheres rurais, além de combater e prevenir esta situação de forma mais apropriada. Vulnerabilidade estrutural, isolamento social e geográfico, questões socioeconômicas e culturais contribuem para a subnotificação e invisibilidade das violências vivenciadas por mulheres rurais, uma vez que também dificultam o acesso a recursos que permitiriam o rompimento desta situação. A sobrecarga de trabalho é um dos muitos tipos da violência que essas mulheres sofrem. “Cuidadoras” em tempo integral (das plantas, horta, animais, dos filhos, marido, idosos, doentes etc.), acumulam triplas jornadas e tem o seu trabalho invisibilizado – ainda que trabalhem mais horas por dia que seus maridos e desenvolvam as mesmas atividades – na dimensão reprodutiva não é valorizado nem valorado, enquanto na dimensão produtiva (lavouras de milho ou café na região) não é reconhecido por ser considerado apenas uma “ajuda”. Os relatos de várias agricultoras da região são de que no final do dia estão muito cansadas e nem sabem o porquê, já que “só cuidaram da casa, do quintal e ajudaram na lavoura”. Também é grande o número de relatos sobre desânimo, baixa autoestima e uso de medicamentos para dormir e para ansiedade. Desde 2011, o Movimento de Mulheres da Zona da Mata e Leste de Minas (MMZML) articula agricultoras de 14 municípios e tem como missão “empoderar as mulheres fortalecendo a luta pela igualdade de gênero e contra a violência, valorizando a si mesma e ao seu trabalho para melhorar suas condições de vida praticando a agroecologia”. Entretanto, embora a violência contra as mulheres seja uma das suas principais bandeiras de luta, ainda é uma questão difícil de ser abordada. De acordo com as agricultoras, ao viajar para reuniões e encontros, a maioria sofre pressões não só da família como também das vizinhas – que não entendem as suas viagens; que julgam que elas deixaram os filhos, o marido e a casa abandonados – o que denota um controle social informal. A violência institucional, cometida pelo Estado e por seus agentes, também faz parte do seu cotidiano e representa um fator limitante para a denúncia, assim como a violência estrutural: devido a escassa circulação de transporte público, precisam caminhar dezenas de quilômetros para acessar os serviços especializados e de acolhimento, muitas vezes inexistentes na região – situações que dificultam a tomada de decisão para as mulheres rurais romperem com o ciclo de violência dentro de casa e reforçam ainda mais a invisibilidade e subnotificação. |