Resumo |
Este trabalho propõe uma reflexão sobre os possíveis diálogos que se estabelecem entre Literatura e Memória, privilegiando as cenas memorialísticas presentes no livro “Quarto de despejo: Diário de uma favelada”, de Carolina Maria de Jesus. Busca refletir, também, sobre como os registros pessoais da autora se configuram por meio de uma memória coletiva, entretecida do histórico de uma época como um “mosaico” de narrativas que se constituem, especialmente, a partir de um tom memorialístico. A descoberta de Carolina Maria de Jesus, enquanto escritora, foi engendrada pelo jornalista Audálio Dantas, em 1958, uma vez que, em encontro com ela, teve acesso a seus inúmeros escritos, entre eles um diário iniciado em 1955. A partir desse encontro, Dantas publicou alguns trechos no extinto jornal “Folha da Noite” e, dois anos depois, a editora Francisco Alves publicou o diário, intitulando-o de “Quarto de despejo: Diário de uma favelada”. Considerando, pois, os diários como fontes guardiãs de memórias, Carolina se apropria de seu diário para organizar e armazenar o registro de fatos distintivos de sua realidade e da realidade de uma nação, marcada por circunstâncias, até então, pouco reveladas nos livros, já que anunciava situações de pobreza, preconceito, discriminação social, dentre outras, também de natureza política e social. Esses registros documentavam experiências importantes para a (re)leitura de uma sociedade conhecida por poucos e ignorada pela maioria dos leitores da época. Ressalta-se, ainda, a importância das narrativas de testemunho para uma consolidação histórica dos fatos, pois os relatos também se constituem da distribuição de importantes referências históricas, ao longo do texto. Em função disso, faz-se mister apontar os diálogos possíveis entre literatura e as instâncias memorialísticas, especialmente na constituição da representação de uma realidade velada e desconhecida dos padrões estéticos definidos para a época, uma vez que levam a reconhecer o destaque de Carolina Maria de Jesus, enquanto escritora, bem como a importância de sua obra para os estudos literários, para além de seu supressivo “status” social, determinado discriminadamente pela condição de negra, pobre, favelada e mulher. |