Resumo |
É notável nas narrativas de João Guimarães Rosa que as mulheres ocupam dois locais possíveis: o lar ou o mundo. Daquelas que habitam o lar é esperado que performem todas as características da mulher idealizada pelo pensamento patriarcal, ou seja, docilidade e submissão aos mandos dos homens. Por outro lado, as mulheres que habitam o mundo dispõem de certa liberdade que se mostra uma ideia ilusória quando confrontada à brutalidade do espaço controlado por homens e pela violência. Desse modo, seja qual for a posição da mulher na sociedade do sertão rosiano, sua condição é estar sempre à margem. Ainda assim, é evidenciado que, por mais rígida que seja a estrutura patriarcal sobre a qual se fundam e se sustentam as relações de poder do sertão recriado por Rosa, tais mulheres são capazes de transgredir suas normas de certa maneira, modificando, desse modo, as condições a que são submetidas e, por consequência, o próprio espaço em que vivem. Partindo desse pressuposto, o presente trabalho visa discutir o tema do adultério feminino enquanto transgressão social em “Campo Geral” e “Buriti”, novelas da coletânea Corpo de Baile, publicada inicialmente no ano de 1956. Nesse contexto, nos interessa analisar a situação das mulheres “do lar” e o impacto de sua infidelidade não apenas para sua vida pessoal e para sua configuração familiar, mas também para a estruturação geral da sociedade sertaneja, partindo da concepção defendida por autores como Soares (2008) e Roncari (2004) de que, em Corpo de Baile, Rosa retrata um “sertão em transformação” que passa, gradualmente, a receber maior controle do poder central em oposição ao mando das oligarquias locais, além de, consequentemente, tomar contato com certa modernidade advinda dos centros urbanos que, no contexto das novelas da coletânea, parecem estar menos distantes do sertão descrito. Dessa forma, tendo como base a pesquisa bibliográfica, demonstra-se que, nas narrativas analisadas, a ação da mulher transgressora possui influência direta nas modificações constatadas no espaço descrito pelo autor e, sendo assim, compreendendo-se o adultério enquanto transgressão, o mesmo atua também como elemento de transformação. |