Resumo |
Aspectos simbólicos alimentam interações e tornam a sociedade espaço de ação individual e coletiva. A cultura - este motor digno de manutenção e reconfigurações constantes por parte dos sujeitos - merece ser compreendida à medida que é intrínseca à vivência social e contribui para a nutrição de uma trama de sentidos e significados para a população. Para melhor entender este campo tão transversal, recorre-se aqui à produções culturais de Viçosa, lugar em que percebe-se tendências de hibridismo cultural entre “nativos” e “forasteiros”. Acolhe-se a tríade cultura, história e cidade para resgatar vetores representativos em duas produções de caráter religioso: a festa católica da padroeira da cidade, a festa de Santa Rita, e o movimento umbandista. Este trabalho visa compreender, por meio dos lugares de memória e das narrativas, como elementos da produção cultural de Viçosa estabelecem ligação direta com o sentido identitário e de pertencimento dos moradores da cidade, a partir de um processo histórico. O levantamento de dados se deu pela busca de documentos e fontes relacionados aos temas e pela técnica snow ball (a indicação de fontes por quem já foi entrevistado). Qualitativa por sua natureza, esta pesquisa buscou suporte em narrativas orais feitas em entrevistas exploratórias e presenciais com dez fontes, cada uma com média de uma hora e meia de duração. Para interpretação do material coletado utilizou-se a Análise de Conteúdo (AC) e técnicas metodológicas em Representações Sociais. Como resultados, percebe-se com a festa de Santa Rita a consolidação de uma tradição que é rememorada com facilidade e possui vínculos fortes com a história centenária da própria cidade, que mantém a data festiva como feriado municipal. Constata-se que a devoção à santa e a participação na festa reflete nos entrevistados principalmente como prática de caridade e união entre os fiéis. No caso da Umbanda, destacam-se nas narrativas sobre este movimento as trajetórias individuais, o que torna um desafio a construção de uma história linear sobre a religião na comunidade viçosense como um todo. Segundo as entrevistas, compreende-se que os valores cultivados por quem segue os princípios umbandistas podem ser resumidos em respeito e resistência. Com isso, considera-se que Viçosa é palco de um contraste evidente entre os dois fenômenos: de um lado, conservadorismo, e de outro, inconstância. Tratar das ramificações dos dois movimentos permitiu a visualização de que a identidade cultural pressupõe tendências de universalismo ou especificidade de valores. Embora ambos sejam referências de orgulho para seus respectivos membros e o empoderamento de um coletivo seja fundamentalmente relativo, neste caso ele existe principalmente a partir do reconhecimento de uma marginalização. A falta de uma história diz muito sobre um objeto, o que nos implica a reflexão sobre a credibilidade do saber popular e quais pessoas e ações são legítimas de aparência na esfera pública. |