Resumo |
A Estratégia Saúde da Família (ESF) é a primeira referência de atenção à saúde de pessoas em sofrimento mental pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Ela atua na detecção, prevenção e acompanhamento dos transtornos mentais. Porém, estudos têm apontado para dificuldades das equipes em lidar com tal demanda. Itinerário terapêutico é a análise e registro dos caminhos percorridos pelos pacientes em busca de saúde, destacando aspectos socioculturais e subjetivos, como a influência da cultura, das crenças e das experiências prévias. Esta pesquisa, vinculada ao grupo “Núcleo de Estudos em Sociedade, Direitos e Diversidade – DIVERSA” e à linha de pesquisa “Comunidades científicas, instituições educativas e diversidade”, teve como objetivo estudar os itinerários terapêuticos percorridos por pacientes com transtornos mentais comuns (TMC) e as particularidades referentes ao papel da ESF no município de Viçosa, Minas Gerais, Brasil. Foram selecionados pacientes previamente diagnosticados com TMC de duas Unidades Básicas da Saúde da Família (UBSF), totalizando 10 usuárias do sexo feminino com idade entre 30 e 65 anos e renda igual ou inferior a um salário mínimo. Realizaram-se entrevistas semiestruturadas visando conhecer os caminhos percorridos pelas pacientes em busca de tratamento e suas experiências quanto ao papel da ESF nesta trajetória. Adotou-se a análise de conteúdo dedutiva com núcleos temáticos – vínculo, acesso, diagnóstico e tratamento do sofrimento mental, papel da atenção primária e da atenção secundária – para descrever os dados. Observou-se que o aparecimento dos sintomas depressivos se mostrou diretamente associado a um fato doloroso e determinante na história das entrevistadas. A minoria realizava acompanhamento do tratamento na UBSF, apesar do tratamento não se dar exclusivamente neste cenário; a maioria usava o sistema particular de saúde e recorria ao SUS apenas para renovação de receitas e encaminhamentos. As críticas se resumem a má qualidade do atendimento na ESF, devido ao tratamento descrito como impessoal e não resolutivo. Os principais obstáculos foram a situação financeira e a dificuldade em marcar consultas, seja na UBSF ou com especialistas no SUS. Foi possível perceber a associação direta entre uma boa relação médico-paciente e o seguimento efetivo do tratamento. A assistência à saúde mental conta com múltiplos obstáculos a sua efetividade, como a falta de habilidade dos profissionais da APS em lidar com os TMC. Vale ressaltar a não utilização do matriciamento como modelo de organização do processo de trabalho entre as equipes da atenção primária e secundária, restringindo o tratamento somente a medicamentos na maioria dos casos, mantendo o cuidado em saúde mental em um modelo patológico/curativo. Neste contexto, é necessária a formação apropriada dos profissionais que atuam nas UBSF. Trabalho em conjunto, compartilhando o plano terapêutico dos pacientes entre nível primário e secundário de cuidado, leva a maior resolubilidade. |