Resumo |
Neste trabalho, recorte da pesquisa de mestrado que investiga as representações da travesti Luana Muniz nas práticas midiáticas digitais brasileiras, propomos uma análise à luz dos estudos discursivos críticos (FAIRCLOUGH, 1992; 2003; CHOULIARAKI; FAIRCLOUGH, 1999) da pregação Manter a coroa de Glória, proferida pelo pe. Fábio de Melo, em um acampamento religioso, transmitido ao vivo pelo canal TV Canção Nova. Nesse momento discursivo, o sacerdote recontextualiza o seu encontro com a ativista Luana Muniz, acontecimento registrado em uma fotografia que teve ampla circulação nas práticas midiáticas nacionais. Como aponta Foucault (1996), os discursos religiosos estão associados às práticas sócio-discursivas, que determinam os sujeitos falantes, as propriedades singulares e os papéis preestabelecidos. Ademais, entendendo que o gênero pregação tem por finalidade produzir um discurso moralizante (CARVALHO, 1993), procuramos compreender como pe. Fábio articula a narrativa de seu encontro com Luana aos discursos particulares da Instituição que representa – a Igreja Católica Apostólica Romana. Interessa-nos investigar as representações que pe. Fábio faz de si e de Luana ao relatar as afetações que esse encontro causou em sua vida. Para isso, adotaremos como ferramentas analíticas as categorias Representação dos Agentes Sociais, Intertextualidade, Interdiscursividade, Avaliação e Modalidade (FAIRCLOUGH, 2003). O problema social, parcialmente discursivo, que norteia essa investigação – a publicização do corpo/identidade travesti atravessada pelo discurso religioso – está associado, principalmente, às questões de Identidades e Gênero. Dessa forma, encontramos nos estudos Queer ferramentas importantes para uma discussão social. Aplicaremos a nossa discussão, também, as categorias sociais: Performatividade, Travesti, Corpo, Identidade de Gênero, Travestifobia (BUTLER, 1990; BENTO 2017; 2008; 2006). Entendemos que analisar as representações do corpo/identidade travesti a partir da publicização da travesti Luana Muniz contribui para os debates sobre esse Corpo particular nas práticas midiáticas e amplia a discussão ao investigar essa tematização no discurso religioso. Após a análise, consideramos que ao se referir a Luana no masculino, demonstrando certa incompreensão quanto à Identidade de Gênero da ativista, pe. Fábio contribui para um apagamento desse Corpo político e de suas pautas. A narrativa do sacerdote é construída, no primeiro momento, em tom humorístico, reiterando os discursos particulares da Travesti caricata e deslegitimando a Identidade desse Corpo diferente da matriz binária homem-pênis/mulher-vagina. Apesar de a construção de seu discurso manter uma concepção religiosa hegemônica sobre a transgeneridade, pe. Fábio promove uma ruptura com a matriz reguladora religiosa ao trazer para o centro da narrativa um corpo abjeto que não corresponde às normas do binarismo biologizante tal como iterado pelas práticas sociais religiosas católicas. |