Resumo |
Um dos pontos que configura a contemporaneidade é a tônica dada aos setores da sociedade representados como “minorias” de forma que grupos marginalizados têm se organizado e suas vozes ouvidas e lidas, mesmo que em espaços próprios, longe das grandes mídias: negras e negros, os grupos LGBTTQ, as mulheres, entre outras minorias, cada vez mais lançam discursos, orais ou escritos, que problematizam suas questões. Esse é o caso das mulheres gordas que, ao resistirem às representações que os grupos hegemônicos (pautados no discurso de corpo padrão) fazem delas, promovem páginas em que suas vozes possam ser lidas, configurando assim representações sobre o corpo gordo feminino, diferente do que a grande mídia faz dele. O presente artigo tem como objetivo traçar um diálogo entre a discussão das cenas de interpelação dos relatos de si de Butler (2015) e a interdiscursividade de Fairclough (2001, 2003) como uma categoria que permite uma análise linguisticamente orientada dessas cenas em relatos de gordas em blogs de empoderamento feminino. Os blogs são gêneros discursivos do espaço virtual que cada vez mais abrigam temáticas de vivências das minorias que buscam reconhecimento social. É nessa perspectiva que blogs de ativismo gordo se encaixam devido à recorrência de mulheres utilizarem tal espaço para relatar o que é ser gorda na contemporaneidade. Se a condição para o relato de si existe no momento de interpelação, trazer os discursos que moldam o reconhecimento – ou a falha deste – é uma das possibilidades de responder a questão “quem és tu” no momento de se relatar. Desse modo, o conceito de interdiscursividade de Fairclough (2001, 2003) pode ser uma categoria discursiva do conceito de cenas de interpelação de Butler (2015), permitindo uma análise crítico-discursiva do relato de si que propõe a autora. Para a análise, utilizaremos os significados representacionais propostos por Fairclough (2001): os discursos e instituições que perpassam pelos textos, (re)articulando ordens do discurso (FOUCAULT 1998; 2010) bem como os significados das palavras, lexicalizações e relexicalizações (FAIRCLOUGH, 2001). Demostraremos como, ao relatar a si, as gordas trazem os discursos que as colocam como um corpo rechaçado e, assim, desvelam as cenas de interpelação e o outro (o tu), em um movimento de (re)articulação que ora confronta o hegemônico ora o admite. |