Resumo |
Doenças e agravos não transmissíveis constituem, atualmente, as principais causas de óbito da população mundial. Dentre estas causas, destacam-se as externas ou não naturais, consideradas como morbimortalidades decorrentes de acidentes e violências. No Brasil, as causas externas aparecem como terceira maior causa de óbito. A violência contra a mulher pode ser manifestada de forma psicológica/moral, patrimonial, sexual e física, sendo o feminicídio, ou seja, a morte violenta de mulheres por razões de gênero, a forma mais extrema delas. No Brasil, alguns sistemas de informação em saúde permitem registrar dados de morbimortalidade por acidentes e violências, entre eles o Sistema de Informação sobre Mortalidade-SIM e o Sistema de Informação de Agravos de Notificação-SINAN. O presente trabalho objetivou analisar de forma integrada tais bancos de dados relacionando o evento “óbito” como sentinela tardio de casos de violência contra a mulher. Trata-se de estudo epidemiológico realizado em Viçosa-MG, incluindo dados secundários do SIM (óbitos por causas externas ou mal definidas) e SINAN - módulos de violência doméstica, sexual e/ou outras violências e intoxicação exógena. Foram incluídas na pesquisa todas as notificações destes módulos e os óbitos por causas externas ou mal definidas, de mulheres residentes, ocorridos entre 2010-2014. Foram identificados 113 óbitos de mulheres, sendo 74% caracterizados como causas mal definidas e 26% como causas externas. Foram notificados 2196 casos de violência doméstica, sexual e outras violências contra a mulher, sendo 67% destes reincidentes. No mesmo período, foram notificados 360 casos de intoxicação exógena entre residentes em Viçosa, sendo 68% no sexo feminino. A análise integrada dos bancos de dados permitiu verificar a existência de relação entre óbitos por causas externas ou violentas em mulheres, casos de intoxicação exógena por tentativa de suicídio e a exposição anterior situação de violência doméstica, sexual e outras violências. Tal constatação baseia-se no fato de que em 15% dos casos notificados de intoxicação exógena em mulheres, havia registro anterior de violência no SINAN, indicando que a possibilidade da tentativa de autoextermínio por intoxicação exógena estar associada à situações de violência vivenciadas pela mulher. Também foi possível verificar a existência de associação entre o óbito de mulheres por causas externas ou violentas e a exposição anterior à situação de violência doméstica, sexual e outras violências. Os resultados do estudo indicaram que em 41% dos óbitos por causas externas ou violentas ocorridos entre mulheres residentes, havia registro de exposição à situações de violência anterior no SINAN. Nesse contexto, reconhece-se a importância da análise integrada e sistemática dos dados, com vistas à compreensão da magnitude e das características desses eventos e suas eventuais relações a fim de subsidiar políticas afirmativas de proteção à mulher e promoção da igualdade de gênero. |