Resumo |
Nossa proposta de investigação dos escritos; Verdadeiras informações das terras do Preste João da Índia, do Padre Francisco Álvares, e, A fé, a religião e os costumes da Etiópia de Damião de Góis, parte da constatação de que, embora a Etiópia tenha sido tema de diversas fontes portuguesas, notamos que a partir da segunda metade do século XVI o espaço de realização da Etiópia, enquanto utopia, havia se desintegrado. Tal constatação confirma a hipótese do históriador Giuseppe Marcocci, de que foram vários os elementos que compuseram o modus operandi do Império. Deste modo, as diferentes apropriações que a Etiópia e seu mítico soberano tiveram na pena de cronistas da cultura letrada do Renascimento português, nos permite identificar tais elementos, além de mudanças no projeto colonial. Esta pesquisa tem como objetivo identificar - através da análise das fontes indicadas, e de uma bibliografia complementar - o suporte ideológico do Império que ganha novos elementos ou mesmo é substituído por outros ao longo da afirmação de sua hegemonia; fazendo com que a Etiópia deixasse de figurar como reino aliado para se transformar em terra de missões. Nos apoiamos nos estudos metodológicos de Quentin Skinner e John Pocock, que buscam circunscrever os termos e os textos em suas conjunturas específicas. Neste sentido, procuramos identificar o sistema de referências no qual Francisco Álvares e Damião de Góis encontram-se inseridos; além de consequentemente desenvolver um estudo dos reinados de D. Manuel (1495-1521) e D. João III (1521-1557. Já o uso semântico de categorias e conceitos são analisados, sobretudo a partir das contribuições de Koselleck e sua história dos conceitos. A análise de Verdadeiras informações das terras do Preste João da Índia e de A fé, a religião e os costumes da Etiópia - a primeira enquanto obra de caráter etnográfico, e a segunda enquanto opúsculo histórico que reúne cartas de características epistolar - nos permite identificar as seguintes categorias: justiça, honra, engenho (no sentido de capacidade inventiva) conversão e natureza. Sumariamente, podemos dizer que estes eixos temáticos parecem projetar a Etiópia numa cultura ainda primitiva; apesar da tentativa de assimilação por meio da religião depreendida por Álvares e do esforço de Góis de obter junto à Sé Romana o reconhecimento da comunidade etíope como cristã católica. Deste modo, se em um primeiro momento as diferenças nos ofícios religiosos e na prática cotidiana, pareceram não configurar-se em um problema para as autoridades portuguesas; a partir da segunda metade do século XVI a percepção de um cristianismo defectivo parece ter contribuído para que se criasse a necessidade do envio de novas embaixadas; não mais na procura de aliados, mas na busca de terras para missões. |